Do evangelho segundo São Mateus 27,22-23.26:
“Retorquiu-lhes Pilatos: ‘E que hei de fazer de Jesus que é chamado Messias?’. Replicaram todos: ‘Seja crucificado!’. Pilatos insistiu: ‘Então, que mal fez Ele?’. Mas eles gritavam mais ainda: ‘Seja crucificado!’. Soltou-lhes então Barrabás. E a Jesus, depois de tê-lo mandado açoitar, entregou-O para ser crucificado.”
O Juiz do Mundo, que um dia voltará para nos julgar a todos, está ali, aniquilado, insultado e inerme diante do juiz terreno. Pilatos não é um monstro de malvadez. Sabe que o condenado diante dele é inocente; procura um modo de libertá-Lo. Mas seu coração está dividido. E, no fim, faz prevalecer sua posição, faz prevalecer a si mesmo, sobre o direito. Também os homens que gritam e pedem a morte de Jesus não são monstros cruéis. Muitos deles, no dia de Pentecostes, sentir-se-ão “emocionados até ao fundo do coração” (At 2,37), quando Pedro lhes disser: “Jesus de Nazaré, Homem acreditado por Deus junto de vós, vós O matastes, cravando-O na cruz pela mão de gente perversa” (At 2,22.23). Mas naquele momento sofrem a influência da multidão. Gritam porque os outros gritam e como gritam os outros. E, assim, a justiça é espezinhada pela covardia, pela pusilanimidade, pelo medo da mentalidade predominante. A voz sutil da consciência fica sufocada pelos brados da multidão. A indecisão e o respeito humano dão força ao mal.
Senhor, fostes condenado à morte porque o medo do olhar alheio sufocou a voz da consciência. E, assim, acontece que, sempre ao longo de toda a história, inocentes são maltratados, condenados e mortos. Quantas vezes também nós preferimos o sucesso à verdade, nossa reputação à justiça. Dai força, na nossa vida, à voz sutil da consciência, à Vossa voz. Olhai-me como olhastes para Pedro depois de Vos ter negado. Fazei com que o Vosso olhar penetre em nossas almas e indique a direção para nossa vida. Àqueles que na Sexta-feira Santa gritaram contra Vós, no dia de Pentecostes destes a contrição do coração e a conversão. E assim destes esperança a todos nós. Não cesseis de dar também a nós a graça da conversão. Pai nosso...
Do evangelho segundo São Mateus 27,27-31:
“Então, os soldados do governador levaram Jesus consigo para o Pretório e reuniram junto dele toda a companhia. Depois de O terem despido, envolveram-No em um manto encarnado. Teceram uma coroa de espinhos, que lhe puseram na cabeça, e, na mão direita, colocaram-Lhe uma cana. Ajoelharam-se diante dEle e escarneceram- No dizendo: ‘Salve, ó rei dos Judeus!’. Depois, cuspiram nEle, pegaram a cana e puseram-se a bater com ela na cabeça de Jesus. Depois de O terem escarnecido, despiram- Lhe o manto, vestiram-Lhe as roupas e levaram-No para ser crucificado.”
Jesus, condenado como pretenso rei, é escarnecido, mas precisamente na troça aparece cruelmente a verdade. Quantas vezes as insígnias do poder trazidas pelos poderosos deste mundo são um insulto à verdade, à justiça e à dignidade do homem! Quantas vezes seus rituais e suas grandes palavras não passam, na realidade, de pomposas mentiras, uma caricatura do dever que lhes incumbe por força de seu cargo, ou seja, colocar-se a serviço do bem. Por isso mesmo, Jesus, Aquele que é escarnecido e que traz a coroa do sofrimento, é o verdadeiro rei. Seu cetro é justiça (cf. Sl 45/44,7). O preço da justiça é sofrimento neste mundo: Ele, o verdadeiro rei, não reina por meio da violência, mas através do amor com que sofre por nós e conosco. Ele carrega a cruz, a nossa cruz, o peso de sermos homens, o peso do mundo. É assim que Ele nos precede e mostra como encontrar o caminho para a vida verdadeira.
Senhor, deixastes que Vos escarnecessem e ultrajassem. Ajudai-nos a não fazer coro com aqueles que escarnecem quem sofre e quem é frágil. Ajudai-nos a reconhecer o Vosso rosto em quem é humilhado e marginalizado. Ajudainos a não desanimar perante as zombarias do mundo quando a obediência à Vossa vontade é ridicularizada. Carregastes a cruz e convidastesnos a seguir-Vos por este caminho (Mt 10,38). Ajudai-nos a aceitar a cruz, a não fugir dela, a não lamentar nem deixar que nossos corações se abatam com as provas da vida. Ajudai-nos a percorrer o caminho do amor e, obedecendo às suas exigências, a alcançar a verdadeira alegria. Pai nosso...
Do livro do profeta Isaías 53,4-6:
“Eram os nossos males que Ele suportava, e as nossas dores que trazia sobre Si. Mas víamos nEle um homem castigado, ferido por Deus e sujeito à humilhação. Ele foi trespassado por causa de nossas culpas, esmagado devido às nossas faltas. O castigo que nos salva caiu sobre Ele, e, por causa de suas chagas, fomos curados. Todos nós, como ovelhas, andávamos errantes, seguindo cada qual seu caminho. E o Senhor fez cair sobre Ele as faltas de todos nós.”
O homem caiu e continua a cair: quantas vezes ele se torna a caricatura de si mesmo, já não é a imagem de Deus, mas algo que põe em ridículo o Criador. Aquele que, ao descer de Jerusalém para Jericó, embateu nos ladrões que o despojaram deixando-o meio morto, sangrando à beira da estrada, não é porventura a imagem por excelência do homem? A queda de Jesus sob a cruz não é apenas a queda do homem Jesus já extenuado pela flagelação. Aqui aparece algo de mais profundo, como diz Paulo na Carta aos Filipenses: “Ele, que era de condição divina, não reivindicou o direito de ser equiparado a Deus. Mas despojou-Se a Si mesmo tomando a condição de servo, tornando-Se semelhante aos homens [...] humilhou-Se a Si mesmo, feito obediente até à morte e morte de cruz” (Fl 2,6-8). Na queda de Jesus sob o peso da cruz, é visível todo Seu itinerário: Sua voluntária humilhação para nos levantar de nosso orgulho. E ao mesmo tempo aparece a natureza de nosso orgulho: a soberba pela qual desejamos emancipar- nos de Deus sendo apenas nós mesmos, pela qual cremos não ter necessidade do amor eterno; queremos organizar nossa vida sozinhos. Nessa revolta contra a verdade, nessa tentativa de nos tornarmos deus, de sermos criadores e juízes de nós mesmos, caímos e acabamos por nos autodestruir. A humilhação de Jesus é a superação de nossa soberba: com Sua humilhação, Ele nos faz levantar. Deixemos que Ele nos levante. Despojemo- nos de nossa auto-suficiência, de nossa errada teimosia em sermos autônomos, e aprendamos o contrário dAquele que se humilhou, ou seja, aprendamos a encontrar nossa verdadeira grandeza, humilhando-nos e voltando-nos para Deus e para os irmãos espezinhados.
Senhor Jesus, o peso da cruz Vos fez cair por terra. O peso de nosso pecado, o peso de nossa soberba Vos joga ao chão. Mas Vossa queda não é sinal de um destino adverso, nem é a pura e simples fraqueza de quem é espezinhado. Quisestes vir até junto de nós, que, por nossa soberba, jazemos por terra. A soberba de pensar que somos capazes de produzir o homem fez com que os homens se tenham tornado uma espécie de mercadoria para se comprar e vender, como que uma reserva de material para nossas experiências, pelas quais esperamos, por nós mesmos, superar a morte, quando, na verdade, conseguimos apenas humilhar cada vez mais profundamente a dignidade do homem. Senhor, vinde em nossa ajuda, porque caímos. Ajudainos a abandonar nossa soberba devastadora e, aprendendo da Vossa humildade, a nos colocarmos novamente de pé. Pai nosso...
Do evangelho segundo São Lucas 2,34-35.51:
“Simeão abençoou-os e disse a Maria, sua Mãe: ‘Ele foi estabelecido para a queda e o reerguimento de muitos em Israel, e para ser sinal de contradição; e uma espada há de traspassar a tua alma. Assim se deverão revelar os intentos de muitos corações’. Sua mãe guardava no coração todas essas recordações.”
Na Via-Sacra de Jesus, aparece também Maria, Sua Mãe. Durante sua vida pública, ela teve de ficar de lado para dar lugar ao nascimento da nova família de Jesus, a família de seus discípulos. Teve também de ouvir estas palavras: “Quem é a minha Mãe e quem são os meus irmãos? Todo aquele que fizer a vontade de meu Pai que está nos céus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe” (Mt 12,48.50). Pode-se agora constatar que Ela é a Mãe de Jesus não só no corpo, mas também no coração. Ainda antes de tê-lo concebido no corpo, por sua obediência ela O concebera no coração. Fora-Lhe dito: “Hás de conceber no teu seio e dar à luz um filho. Ele será grande, o Senhor Deus lhe dará o trono de seu pai Davi” (Lc 1,31-32). Mas algum tempo depois ouvira da boca do velho Simeão uma palavra diferente: “Uma espada Te há de trespassar a alma” (Lc 2,35). Nessa ocasião, Ela deve ter se lembrado de certas palavras pronunciadas pelos profetas, tais como: “Foi maltratado e resignouse, não abriu a boca, como cordeiro levado ao matadouro” (Is 53,7). Agora tudo isso se torna realidade. No coração, tinha sempre conservado as palavras que o anjo Lhe dissera quando tudo começou: “Não tenhas receio, Maria” (Lc 1,30). Os discípulos fugiram; Ela não foge. Ela está ali, com a coragem de mãe, com a fidelidade de mãe, com a bondade de mãe, e com sua fé, que resiste na escuridão: “Feliz daquela que acreditou” (Lc 1,45). “Mas, quando o Filho do Homem voltar, encontrará fé sobre a terra?” (Lc 18,8). Sim, agora Ele o sabe: encontrará fé. E essa é, naquela hora, sua grande consolação.
Santa Maria, Mãe do Senhor, permanecestes fiel quando os discípulos fugiram. Tal como acreditastes quando o anjo Vos anunciou o que era incrível – que haverias de ser Mãe do Altíssimo –, assim também acreditastes no momento de Sua maior humilhação. E foi assim que, na hora da cruz, na hora da noite mais escura do mundo, Vos tornastes Mãe dos que crêem, Mãe da Igreja. Nós Vos pedimos: ensinainos a acreditar e ajudai-nos para que a fé se torne coragem de servir e gesto de um amor que socorre e sabe partilhar o sofrimento. Pai nosso...
Do evangelho segundo São Mateus 27,32; 16,24:
“Ao saírem, encontraram um homem de Cirene, chamado Simão, e requisitaram-no para levar a cruz de Jesus. Jesus disse aos discípulos: ‘Se alguém quiser seguir-Me, renegue-se a si mesmo, pegue sua cruz e siga-Me’.”
Simão de Cirene regressa do trabalho, está a caminho de casa quando cruza com aquele triste cortejo de condenados – para ele talvez fosse um espetáculo habitual. Os soldados valem- se de seu direito de coação e colocam a cruz às costas dele, robusto homem do campo. Que aborrecimento não deverá ter sentido ao ver-se inesperadamente envolvido no destino daqueles condenados! Faz o que deve fazer, mas certamente com grande relutância. E todavia o evangelista Marcos nomeia, juntamente com o cireneu, também seus filhos, que evidentemente eram conhecidos como cristãos, como membros daquela comunidade (Mc 15,21). Do encontro involuntário, brotou a fé. Acompanhando Jesus e compartilhando o peso da cruz, o cireneu compreende que é uma graça poder caminhar junto com aquele Crucificado e assisti-Lo. O mistério de Jesus, que sofre calado, toca-lhe o coração. Jesus, cujo amor divino era o único que podia – e pode – redimir a humanidade inteira, quer que compartilhemos Sua cruz para completar o que ainda falta a Seus sofrimentos (Cl 1,24). Sempre que, bondosamente, vamos ao encontro de alguém que sofre, alguém perseguido e inerme, partilhando seu sofrimento ajudamos a levar a própria cruz de Jesus. E assim obtemos salvação e podemos, nós mesmos, contribuir para a salvação do mundo.
Senhor, abristes a Simão de Cirene os olhos e o coração, dando-lhe, na partilha da cruz, a graça da fé. Ajudai-nos a assistir nosso próximo que sofre, ainda que esse chamado seja contrário a nossos projetos e nossas simpatias. Concedei-nos reconhecer que é uma graça poder partilhar a cruz dos outros e experimentar que dessa forma estamos a caminhar convosco. Fazei-nos reconhecer com alegria que é precisamente pela partilha do Vosso sofrimento e dos sofrimentos deste mundo que nos tornamos ministros da salvação, podendo assim ajudar a construir o Vosso corpo, a Igreja. Pai nosso...
Do livro do profeta Isaías 53,2-3:
“O meu Servo cresceu sem distinção nem beleza que atraia o nosso olhar, nem aspecto agradável que possa cativar-nos. Desprezado e repelido pelos homens, homem de dores, afeito ao sofrimento, é como aquele a quem se volta a cara, pessoa desprezível, da qual se não faz caso.”
Do livro dos Salmos 27/26,8-9:
“Meu coração fala convosco confiante, e os meus olhos Vos procuram. Senhor, é Vos sa face que eu procuro; não me escondais a Vossa face! Não afasteis em Vossa ira o Vosso servo, sois Vós o meu auxílio! Não me esqueçais nem me deixeis abandonado, meu Deus e Salvador.”
Verônica – Berenice, segundo a tradição grega – encarna este anseio que irmana todos os indivíduo piedosos do Antigo Testamento: o anseio que todos os homens crentes têm de verem o rosto de Deus. Em todo caso, na Via-Sacra de Jesus, Verônica inicialmente se limitara a prestar um serviço de gentileza feminina: oferecer um lenço a Jesus. Não se deixa contagiar pela brutalidade dos soldados, nem imobilizar pelo medo dos discípulos. É a imagem da mulher bondosa que, perante a perturbação e a escuridão dos corações, mantém a coragem da bondade, não permite que seu coração permaneça na escuridão: “Bemaventurados os puros de coração, porque verão a Deus” – dissera o Senhor no Sermão da Montanha (Mt 5,8). No princípio, Verônica via apenas um rosto maltratado e marcado pela dor. Mas o ato de amor imprime em seu coração a verdadeira imagem de Jesus: no rosto humano, coberto de sangue e de feridas, ela vê o Rosto de Deus e de Sua bondade, que nos acompanha mesmo na dor mais profunda. Somente com o coração podemos ver Jesus. Apenas o amor nos torna capazes de ver e nos torna puros. Só o amor nos faz reconhecer Deus, que é o próprio amor.
Senhor, dai-nos a inquietação do coração que procura Vosso rosto. Protegei-nos da escuridão do coração que vê apenas a superfície das coisas. Concedei-nos aquela generosidade e pureza de coração que nos tornam capazes de ver Vossa presença no mundo. Quando não pudermos realizar grandes coisas, dai-nos a coragem de uma bondade humilde. Imprimi Vosso rosto em nossos corações, para podermos Vos encontrar e mostrar ao mundo Vossa imagem. Pai nosso...
Do livro das Lamentações 3,1-2.9.16:
“Eu sou o homem que conheceu a miséria sob a vara do seu furor. Ele me guiou e me fez andar nas trevas e não na luz. Bloqueou meus caminhos com blocos de pedra, obstruiu minhas veredas. Ele quebrou meus dentes com cascalho, mergulhou-me na cinza.”
A tradição da tríplice queda de Jesus sob o peso da cruz recorda a queda de Adão – o ser humano caído que somos nós – e o mistério da associação de Jesus a nossa queda. Na história, a queda do homem assume sempre novas formas. Em sua primeira carta, São João fala duma tríplice queda do homem: a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida. Assim interpreta ele a queda do homem e da humanidade, no horizonte dos vícios de seu tempo com todos os seus excessos e depravações. Mas, olhando a história mais recente, podemos também pensar por que a cristandade, cansada da fé, abandonou o Senhor: as grandes ideologias, com a banalização do homem, que já não crê em nada e se deixa simplesmente ir à deriva, construíram um novo paganismo – um paganismo pior que o antigo –, o qual, desejoso de marginalizar definitivamente Deus, acabou por perder o homem. Eis o homem que jaz no pó. O Senhor carrega esse peso e cai, cai para poder chegar até nós; Ele nos olha para que em nós volte a palpitar o coração; cai para nos levantar.
Senhor Jesus Cristo, carregastes nosso peso e continuais a nos carregar. É nosso peso que Vos faz cair. Mas sois Vós a nos levantar, porque, sozinhos, não conseguimos nos erguer do pó. Livrai-nos do poder da concupiscência. Em vez do coração de pedra, dai-nos novamente um coração de carne, um coração capaz de ver. Destruí o poder das ideologias, para os homens poderem reconhecer que estão permeadas de mentiras. Não permitais que o muro do materialismo se torne intransponível. Fazei com que Vos ouçamos de novo. Tornai-nos sóbrios e vigilantes para podermos resistir às forças do mal e ajudainos a reconhecer as necessidades interiores e exteriores dos outros, e a socorrê-las. Erguei-nos, para podermos levantar os outros. Concedei-nos esperança no meio de toda esta escuridão, para podermos ser portadores de esperança no mundo. Pai nosso...
Do evangelho segundo São Lucas 23,28-31:
“Jesus voltou-Se para elas e disse-lhes: ‘Mulheres de Jerusalém, não choreis por Mim; chorai antes por vós mesmas e pelos vossos filhos. Pois dias virão em que se dirá: “Felizes as estéreis, as entranhas que não tiveram filhos e os peitos que não amamentaram”. Nessa altura, começarão a dizer aos montes: “Caí sobre nós”, e às colinas: “Cobrinos”. Porque, se fazem assim no madeiro verde, que será no madeiro seco?’.”
As palavras com que Jesus adverte as mulheres de Jerusalém que O seguem e choram por Ele fazem-nos refletir. Como entender tais palavras? Não se trata porventura de uma advertência contra uma piedade puramente sentimental, que não se torna conversão e fé vivida? De nada serve lamentar, por palavras e sentimentalmente, os sofrimentos deste mundo, se nossa vida continua sempre igual. Por isso, o Senhor nos adverte do perigo em que nós próprios nos encontramos. Mostra-nos a seriedade do pecado e a seriedade do juízo. Apesar de todas as nossas palavras de horror diante do mal e dos sofrimentos dos inocentes, não somos nós porventura demasiadamente inclinados a banalizar o mistério do mal? Da imagem de Deus e de Jesus, no fim das contas, não admitimos apenas o aspecto terno e amável, enquanto tranqüilamente cancelamos a dimensão do juízo? Como poderia Deus fazer-Se um drama com nossa fragilidade – pensamos conosco –, não passamos de simples homens?! Mas, fixando os sofrimentos do Filho, vemos toda a seriedade do pecado, vemos como tem de ser expiado até o fim para poder ser superado. Não podemos continuar a banalizar o mal, quando vemos a imagem do Senhor que sofre. Também a nós, diz Ele: Não choreis por Mim, chorai por vós próprios... porque, se tratam assim o madeiro verde, que será do madeiro seco?
Senhor, às mulheres que choravam, falastes de penitência, do Dia do Juízo, quando nos encontrarmos diante da Vossa face, a face do Juiz do Mundo. Chamais-nos a sair da banalização do mal que nos deixa tranqüilos para podermos continuar nossa vida de sempre. Mostrai-nos a seriedade de nossa responsabilidade, o perigo de sermos encontrados, no Juízo, culpados e estéreis. Fazei com que não nos limitemos a caminhar ao Vosso lado oferecendo apenas palavras de compaixão. Convertei-nos e dai-nos uma vida nova; não permitais que acabemos por ficar como um madeiro seco, mas fazei que nos tornemos ramos vivos em Vós, a videira verdadeira, e produzamos fruto para a vida eterna (Jo 15,1-10). Pai nosso...
Do livro das Lamentações 3,27-32:
“É bom para o homem suportar o jugo desde sua juventude. Que esteja solitário e silencioso quando o Senhor o impuser sobre ele; que ponha sua boca no pó: talvez haja esperança! Que dê sua face a quem o fere e se sacie de opróbrios. Pois o Senhor não rejeita para sempre: se Ele aflige, Ele se compadece segundo sua grande bondade.”
E que dizer da terceira queda de Jesus sob o peso da cruz? Pode talvez fazer-nos pensar na queda do homem em geral, no afastamento de muitos de Cristo, caminhando à deriva para um secularismo sem Deus. Mas não deveríamos pensar também em tudo quanto Cristo tem sofrido em sua própria Igreja? Quantas vezes se abusa do Santíssimo Sacramento da Sua presença! Freqüentemente como está vazio e ruim o coração onde Ele entra! Tantas vezes celebramos apenas nós próprios, sem nem sequer nos darmos conta dEle! Quantas vezes se distorce Sua Palavra! Quantas vezes se abusa de Sua Palavra! Quão pouca fé existe em tantas teorias, quantas palavras vazias! Quanta sujeira há na Igreja, e precisamente entre aqueles que, no sacerdócio, deveriam pertencer completamente a Ele! Quanta soberba, quanta auto-suficiência! Respeitamos tão pouco o sacramento da reconciliação, em que Ele está a nossa espera para nos levantar de nossas quedas! Tudo isso está presente em Sua paixão. A traição dos discípulos, a recepção indigna de seu Corpo e de seu Sangue são certamente o maior sofrimento do Redentor, o que Lhe trespassa o coração. Nada mais podemos fazer que dirigir-Lhe, do mais profundo da alma, este grito: Kyrie, eleison! – Senhor, salvai-nos! (Mt 8,25).
Senhor, muitas vezes Vossa Igreja parecenos uma barca que está para afundar, uma barca em que entra água por todos os lados. E, mesmo no Vosso campo de trigo, vemos mais cizânia que trigo. O vestido e o rosto tão sujos de Vossa Igreja muitas vezes nos horrorizam. Mas somos nós mesmos que os sujamos! Somos nós mesmos que Vos traímos sempre, depois de todas as nossas grandes palavras, os nossos grandes gestos. Tende piedade de Vossa Igreja: também dentro dela, Adão continua a cair. Com nossa queda, nós Vos jogamos no chão, e Satanás se põe a rir porque espera que não mais conseguireis levantar-Vos daquela queda; espera que Vós, tendo sido arrastado na queda de Vossa Igreja, ficareis por terra, derrotado. Mas Vos erguereis. Vós Vos levantastes, ressuscitastes e podeis levantar-nos também a nós. Salvai e santificai Vossa Igreja. Salvai e santificai a todos nós. Pai nosso...
Do evangelho segundo São Mateus 27,33-36:
“Chegando a um lugar chamado Gólgota – que quer dizer ‘Lugar do Crânio’ –, deram-Lhe a beber vinho misturado com fel. Mas Jesus, quando o provou, não quis beber. Depois de O terem crucificado, repartiram entre si as suas vestes, tirando-as à sorte, e ficaram ali sentados a guardá-Lo.”
Jesus é despojado de suas vestes. A roupa confere ao homem sua posição social, dá-lhe seu lugar na sociedade e o faz sentir-se alguém. Ser despojado em público significa que Jesus já não é ninguém, nada mais é que um marginalizado, desprezado por todos. O momento do despojamento nos recorda também a expulsão do Paraíso: o homem ficou sem o esplendor de Deus; agora está ali, nu e exposto, desnudado e envergonhado. Desse modo, Jesus assume mais uma vez a situação do homem caído. Jesus despojado recorda-nos o fato de que todos perdemos a “primeira veste”, isto é, o esplendor de Deus. Junto da cruz, os soldados lançam sortes para repartirem entre si aqueles míseros haveres, as vestes de Jesus. Os evangelistas narram esse episódio com palavras tiradas do Salmo 22,19 e assim afirmam-nos o mesmo que Jesus há de dizer aos discípulos de Emaús: tudo aconteceu “conforme as Escrituras”. Não se trata aqui de pura coincidência: tudo o que acontece está contido na Palavra de Deus e conforme Seu desígnio divino. O Senhor experimenta todos os graus da perdição dos homens, e cada um deles é, com toda a sua amargura, um passo da redenção: é precisamente assim que Ele traz de volta para casa a ovelha perdida. Recordemos ainda que, segundo diz São João, o objeto do sorteio era a túnica de Jesus, a qual, “toda tecida de alto a baixo, não tinha costura” (Jo 19,23). Podemos considerar isso uma alusão à veste do sumo sacerdote, que era “tecida como um todo”, sem costura (Flávio Josefo, Antiguidades judaicas, III, 161). Ele, o Crucificado, é realmente o verdadeiro sumo sacerdote.
Senhor Jesus, fostes despojado de Vossas vestes, exposto à desonra, expulso da sociedade. Assumistes sobre Vós a desonra de Adão, sanando-a. Assumistes os sofrimentos e as necessidades dos pobres, daqueles que são expulsos do mundo. Deste modo é que realizais a palavra dos profetas. É precisamente assim que dais significado àquilo que não tem significado. Assim mesmo nos dais a conhecer que estais nas mãos do Vosso Pai – Vós, nós e o mundo. Concedei-nos um respeito profundo pelo homem em todas as fases de sua existência e em todas as situações em que o encontrarmos. Dainos a veste luminosa de Vossa graça. Pai nosso...
Do evangelho segundo São Mateus 27,37-42:
“Puseram acima da cabeça de Jesus um letreiro escrito com a causa da condenação: ‘Este é Jesus, o Rei dos Judeus’. Foram então crucificados com Ele dois ladrões, um à direita e outro à esquerda. Os que passavam dirigiam-Lhe insultos, abanavam a cabeça e diziam: ‘Tu, que demolias o Templo e o reedificavas em três dias, salva-Te a Ti mesmo, se és Filho de Deus, e desce da cruz!’. Também os sumos sacerdotes zombavam, juntamente com os escribas e os anciãos, dizendo: ‘Salvou os outros e a Si mesmo não pode salvar-Se! É Rei de Israel! Desça agora da cruz, e acreditaremos nele’.”
Jesus é pregado na cruz. O sudário de Turim permite formar uma idéia da crueldade incrível desse processo. Jesus não toma a bebida anestesiante que Lhe fora oferecida: conscientemente assume todo o sofrimento da crucifixão. Todo Seu corpo é martirizado; cumpriram-se as palavras do Salmo: “Eu, porém, sou um verme e não um homem, o opróbrio dos homens rebotalho do povo” (Sl 22/21,7). “Como um homem diante do qual se tapa o rosto, menosprezado e desestimado. Na verdade Ele tomou sobre Si as nossas doenças, carregou as nossas dores” (Is 53,3-4). Detenhamo-nos diante dessa imagem de sofrimento, diante do Filho de Deus sofredor. Olhemos para Ele nos momentos de presunção e de prazer, para aprendermos a respeitar os limites e a ver a superficialidade de todos os bens puramente materiais. Olhemos para Ele nos momentos de calamidade e de angústia, para reconhecermos que precisamente assim estamos perto de Deus. Procuremos reconhecer Seu rosto naqueles que tendemos a desprezar. Diante do Senhor condenado, que não quer usar Seu poder para descer da cruz, mas antes suporta os sofrimentos da cruz até o fim, pode assomar ainda outro pensamento. Inácio de Antioquia, ele mesmo preso com cadeias por sua fé no Senhor, elogiou os cristãos de Esmirna pela fé inabalável deles: afirma que estavam, por assim dizer, pregados com a carne e o sangue à cruz do Senhor Jesus Cristo (1,1). Deixemonos pregar a Ele, sem ceder a qualquer tentação de nos separarmos nem ceder às zombarias que pretendem levar-nos a fazê-lo.
Senhor Jesus Cristo, fizestes-Vos pregar na cruz, aceitando a crueldade terrível desse tormento, a destruição de Vosso corpo e Vossa dignidade. Fizestes-Vos pregar, sofrestes sem evasões nem descontos. Ajudai-nos a não fugir perante o que somos chamados a realizar. Ajudainos a nos ligar estreitamente a Vós. Ajudai-nos a desmascarar a falsa liberdade que nos quer afastar de Vós. Ajudai-nos a aceitar Vossa liberdade “ligada” e a encontrar nessa estreita ligação convosco a verdadeira liberdade. Pai Nosso...
Do evangelho segundo São Mateus 27,45-50.54:
“A partir do meio-dia, houve trevas em toda a região, até às três horas da tarde. E, pelas três horas da tarde, Jesus bradou com voz forte: ‘Eli, Eli, lamá sabachthani’, quer dizer, ‘Meu Deus, Meu Deus, por que Me abandonaste?’. Alguns dos presentes ouviram e disseram: ‘Está a chamar por Elias’. E logo um deles correu a pegar numa esponja, ensopou-a em vinagre, pô-la numa cana e deu-Lhe a beber. Mas os outros disseram: ‘Deixa lá! Vejamos se Elias vem salvá-Lo’. E Jesus, dando novamente um forte brado, expirou. Entretanto, o centurião e os que estavam com ele de guarda a Jesus, ao verem o tremor de terra e o que estava a suceder, ficaram aterrados e disseram: ‘Ele era, na verdade, Filho de Deus’.”
No cimo da cruz de Jesus – nas duas línguas do mundo de então, o grego e o latim, e na língua do povo eleito, o hebraico – está escrito quem Ele é: Rei dos Judeus, o Filho prometido a Davi. Pilatos, o juiz injusto, tornou-se profeta sem querer. Perante a opinião pública mundial é proclamada a realeza de Jesus. O próprio Jesus não tinha aceito o título de Messias, pois isso daria ensejo a uma idéia errada, humana, de poder e salvação. Mas, agora, o título pode estar escrito ali publicamente sobre o Crucificado. Ele, assim, é verdadeiramente o rei do mundo. Agora foi verdadeiramente “elevado”. Em sua descida, Ele subiu. Agora cumpriu radicalmente o mandamento do amor, cumpriu a oferta de Si próprio, e precisamente desse modo Ele é agora a manifestação do verdadeiro Deus, daquele Deus que é amor. Agora sabemos quem é Deus. Agora sabemos como é a verdadeira realeza. Jesus reza o Salmo 22, que começa com estas palavras: “Meu Deus, meu Deus, por que Me abandonaste?” (Sl 22/21,2). Assume em Si mesmo todo o Israel, a humanidade inteira, que sofre o drama da escuridão de Deus e faz com que Deus Se manifeste justo onde parece estar definitivamente derrotado e ausente. A cruz de Cristo é um acontecimento cósmico. O mundo fica na escuridão quando o Filho de Deus sofre a morte. A terra treme. E junto da cruz tem início a Igreja dos pagãos. O centurião romano reconhece, compreende que Jesus é o Filho de Deus. Da cruz, Ele triunfa sem cessar.
Senhor Jesus Cristo, na hora de Vossa morte, o sol escureceu. Sois pregado na cruz sem cessar. Precisamente nesta hora da história, vivemos na escuridão de Deus. Pelo sofrimento sem medida e pela maldade dos homens, o rosto de Deus, Vosso rosto, aparece obscurecido, irreconhecível. Mas foi precisamente na cruz que Vos fizestes reconhecer. Precisamente enquanto sois Aquele que sofre e que ama, sois Aquele que é elevado. Foi precisamente lá que triunfastes. Ajudai-nos, nesta hora de escuridão e confusão, a reconhecer Vosso rosto. Ajudai-nos a crer em Vós e a seguir-Vos precisamente na hora da escuridão e da privação. Mostrai-Vos novamente ao mundo nesta hora. Fazei com que Vossa salvação se manifeste. Pai nosso...
Do evangelho segundo São Mateus 27,54-55:
“O centurião e os que estavam com ele de guarda a Jesus, ao verem o tremor de terra e o que acontecia, ficaram aterrados e disseram: ‘Ele era, na verdade, Filho de Deus’. Estavam ali, a observar de longe, muitas mulheres, que tinham seguido Jesus desde a Galiléia, para O servirem.”
Jesus morreu, seu coração é trespassado pela lança do soldado romano e dele brotam sangue e água: misteriosa imagem do rio dos sacramentos, do Batismo e da Eucaristia, dos quais, em virtude do coração trespassado do Senhor, renasce incessantemente a Igreja. E não Lhe são quebradas as pernas, como aos outros dois crucificados; desse modo Ele aparece como o verdadeiro cordeiro pascal, ao qual nenhum osso deve ser quebrado (Ex 12,46). E, agora que tudo suportou, vemos que Ele, apesar de toda a confusão dos corações, apesar do poder do ódio e da covardia, não ficou sozinho. Os fiéis existem. Junto da cruz, estavam Maria, sua Mãe; a irmã de sua Mãe, Maria; Maria de Magdala e o discípulo que Ele amava. Agora chega também um homem rico, José de Arimatéia: o rico encontra o modo de passar pelo buraco de uma agulha, porque Deus lhe dá a graça. Sepulta Jesus em seu túmulo ainda intacto, num jardim: o cemitério onde jaz o corpo de Jesus transforma-se em jardim – no jardim donde fora expulso Adão quando se separara da plenitude da vida, de seu Criador. O túmulo no jardim nos faz saber que o domínio da morte está para terminar. E chega também um membro do Sinédrio, Nicodemos, a quem Jesus tinha anunciado o mistério do renascimento pela água e pelo Espírito. Até mesmo no Sinédrio, que tinha decidido pela crucificação de Cristo, há alguém que acredita, que conhece e reconhece Jesus após Sua morte. Sobre a hora do grande luto, da grande escuridão e do desespero, aparece misteriosamente a luz da esperança. O Deus escondido permanece em qualquer circunstância o Deus vivo e próximo. O Senhor morto permanece em qualquer circunstância o Senhor e nosso Salvador, mesmo na noite da morte. A Igreja de Jesus Cristo, Sua nova família, começa a se formar.
Senhor, Vós descestes à escuridão da morte. Mas Vosso corpo é recolhido por mãos bondosas e envolvido num cândido lençol (Mt 27,59). A fé não está completamente morta, não se pôs totalmente o sol. Quantas vezes parece que Vós estais dormindo. Como é fácil a nós, homens, afastar-nos dizendo para nós mesmos: Deus morreu. Fazei com que, na hora da escuridão, reconheçamos que em qualquer circunstância Vós estais lá. Não nos deixeis sozinhos quando tendemos a desanimar. Ajudai-nos a não Vos deixar sozinho. Dai-nos uma fidelidade que resista no desânimo e um amor que Vos acolha no momento mais extremo de Vossa necessidade, como Vossa Mãe, que Vos abraçou de novo em seu regaço. Ajudai-nos, ajudai os pobres e os ricos, os simples e os sábios, a ver através dos medos e preconceitos e a oferecer-Vos nossa capacidade, nosso coração, nosso tempo, preparando assim o jardim no qual possa dar-se a ressurreição. Pai nosso...
Do evangelho segundo São Mateus 27,59-61:
“José pegou no corpo de Jesus, envolveu-o num lençol limpo e depositou-o no seu túmulo novo, que tinha mandado escavar na rocha. Depois, rolou uma grande pedra para a porta do túmulo e retirou-se. Entretanto, estavam ali Maria de Magdala e a outra Maria, sentadas em frente do sepulcro.”
Jesus, depois de ter sido desonrado e ultrajado, é deposto com todas as honras num túmulo novo. Nicodemos traz uma mistura de mirra e aloés de cem libras destinada a emanar um perfume precioso. Agora na oferta do Filho revela-se, como sucedera já na unção de Betânia, um excesso que nos recorda o amor generoso de Deus, a “superabundância” de Seu amor. Deus faz generosamente oferta de Si próprio. Se a medida de Deus é superabundante, também para nós nada deveria ser demasiado para Deus. Foi o que o próprio Jesus nos ensinou no Sermão da Montanha (Mt 5,20). Mas é preciso lembrar também as palavras de São Paulo: Deus “por nosso meio faz sentir em todos os lugares o perfume de seu conhecimento. Somos, para Deus, o bom odor de Cristo” (2Cor 2,14-15). Na putrefação das ideologias, nossa fé deveria ser de novo o perfume que reconduz às pegadas da vida. No momento da deposição, começa a realizar-se a palavra de Jesus: “Em verdade, em verdade vos digo: Se o grão de trigo, caindo na terra, não morrer, fica ele só; mas, se morrer, dá muito fruto” (Jo 12,24). Jesus é o grão de trigo que morre. Do grão de trigo morto começa a grande multiplicação do pão que dura até o fim do mundo. Ele é o pão de vida capaz de saciar em medida superabundante a humanidade inteira e dar-lhe o alimento vital: o Verbo eterno de Deus, que Se fez carne e também pão, para nós, através da cruz e da ressurreição. Sobre a sepultura de Jesus resplandece o mistério da Eucaristia.
Senhor Jesus Cristo, na sepultura fizestes Vossa a morte do grão de trigo, Vos tornastes o grão de trigo morto que produz fruto ao longo de todos os tempos até a eternidade. Do sepulcro brilha em cada tempo a promessa do grão de trigo, do qual provém o verdadeiro maná, o pão de vida em que Vós Vos ofereceis a nós. A Palavra eterna, através da encarnação e da morte, tornou-se a Palavra próxima: Vós Vos colocais em nossas mãos e nossos corações para que a Vossa Palavra cresça em nós e produza fruto. Dais-Vos a Vós através da morte do grão de trigo, para que nós tenhamos a coragem de perder nossa vida para encontrá-la; para que também nós nos fiemos da promessa do grão de trigo. Ajudai-nos a amar cada vez mais Vosso mistério eucarístico e a venerá-lo – a viver verdadeiramente de Vós, Pão do Céu. Ajudai-nos a nos tornar Vosso “odor”, a tornar palpáveis os vestígios de Vossa vida neste mundo. Do mesmo modo que o grão de trigo se eleva da terra como caule e espiga, assim também Vós não podeis ficar no sepulcro: o sepulcro está vazio porque Ele – o Pai – não Vos “abandonou na habitação dos mortos nem permitiu que a Vossa carne conhecesse a decomposição” (cf. At 2,31; Sl 16,10). Não, Vós não experimentastes a corrupção. Ressuscitastes e destes espaço à carne transformada no coração de Deus. Fazei com que possamos nos alegrar com essa esperança e possamos levá-la jubilosamente pelo mundo; fazei com que nos tornemos testemunhas de Vossa ressurreição. Pai nosso....