Uma das características fundamentais da Vida Consagrada é a vida fraterna, é o “viver em comunidade”. Todavia, ao tratarmos desse assunto na vida do franciscano na Providência, temos que alcançar a especificidade que nos distingue de todos os demais estilos de vida comunitária das diversas ordens, congregações ou comunidades de aliança e vida.
O texto que nos permite mergulhar na profundeza da vida comunitária do franciscano na Providência encontra-se na Regra para os Eremitérios [RE]. Embora essa regra tenha sido escrita para os frades que desejavam viver nos ermos, podemos, através dela, compreender o sentido profundo da vida fraterna do franciscano na Providência. Eis o texto: “1. aqueles que querem viver religiosamente nos ermos, sejam em três ou no máximo quatro. Dois deles sejam as mães e tenham dois ou pelos menos um como filho”.
Na vida comunitária um frade deve desenvolver a capacidade de ser “mãe” de seus irmãos. Uma mãe não esquece nunca de seu filho, quer educá-lo amorosamente, ampará-lo nas quedas, participar de suas alegrias, sofrer por ele e com ele nos momentos de dor. Uma mãe é capaz de doar-se de forma alegre e silenciosa. De modo semelhante o frade na Providência quer viver o mandamento do amor: “que vos ameis uns ao outros como eu vos amei. Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida por seus irmãos” (Jo 15, 12s).
O Frade na Providência deve saber doar-se de forma resignada, isto é, acolher amorosamente a falhas, os erros e limitações de seus irmãos para que o possa admoestar, educar amorosamente, reconduzindo-o ao Caminho, à Verdade e à Vida que é Jesus. Muitas vezes essa resignação significa silenciar diante das ofensas sofridas, para torná-las objetos de oração e preces em favor do irmão. É sair de si para resgatar a ovelha perdida e trazê-la ao ombro.
Viver a dor do irmão (com o irmão) é fundamental para que a vida comunitária e a missão sejam frutuosas; quem não tem compaixão pelo irmão também é incapaz de viver com ele suas alegrias e, menos ainda, é capaz de conviver fraternalmente com ele. É preciso ter olhos de mãe para com os irmãos, isto é, o frade na Providência deve muito mais se ater à beleza do confrade do que aos seus erros, pecados, e limites. Somos feitos a imagem e semelhança de Deus (cf Gn 1,26), e olhar profundo de mãe é capaz de enxergar essa misteriosa beleza em cada um de seus irmãos. Por isso diz o programa de vida de nossa fraternidade: “nenhuma ação do próximo sem ser interpretada benignamente”.
Por outro lado, São Francisco nos convida a sermos filhos. O filho sabe que a mãe é amor e proteção. O frade na Providência é chamado a contemplar e experimentar o amor protetor da mãe na presença dos irmãos, por essa razão sente-se bem em estar próximo de seus irmãos. O frade na Providência sente a necessidade de retribuir o amor recebido, do mesmo modo que os filhos procuram através de gestos carinhosos, palavras doces, atenção alegre e sorriso franco retribuir a alegre presença da mãe.
O frade é chamado ainda a viver em constante humildade, pois sabe que aprende com seus irmãos, de modo semelhante como os filhos buscam conhecer o mundo através dos ensinamentos da mãe. O filho busca conhecer os valores que a mãe tem a lhe passar; analogamente o frade na Providência busca aprender os valores da vida, do carisma e da missão com todos os seus irmãos, sejam eles com mais ou menos de vida consagrada.
Outro trecho que nos faz compreender de modo profundo a vida comunitária dos frades na Providencia, encontra-se no texto da mesma regra: “10Os filhos, porém, assumam alternadamente o ofício das mães”.
O frade na Providência não entende a vida fraterna como uma “via crucis”, mas como uma relação familiar onde há problemas e diferença a serem superados, mas há principalmente o desejo de viver o amor cantado na carta aos coríntios (1Cor 13): “O amor é paciente, é amável; o amor não é invejoso nem fanfarrão, não é orgulhoso nem faz coisas inconvenientes, não procura o próprio interesse, não se irrita não guarda rancor, não se alegra com a injustiça, mas se alegra com a verdade. Tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta”. A vida fraterna dos frades na Providência é o esforço e o desejo de viver já aqui na terra a convivência esperada e anunciada da eterna alegria do paraíso.
A segunda parte da Oração de são Francisco apresentam o conjunto de atitudes que o frade na Providência deve cultivar, através do exercício diário, para concretizar a vida fraterna:
"...Fazei que eu procure mais consolar que ser consolado Compreender que ser compreendido Amar que se amado Pois é dando que se recebe É perdoando que se é perdoado E é morrendo que se vive para a vida eterna..."
Todo esforço do frade na Providência em viver a vida fraterna alegre, como mãe e filho, significa o desejo de frutificar para a vinha do Senhor, frutificar na Igreja, pois, sabe o frade na Providência que se não souber cultivar o amor na vida fraterna, não será capaz de cultivar o amor na missão, não será capaz de cultivar o amor puro e verdadeiro por todos os que são assistidos em nossa obras; isto é, não será capaz de viver nosso carisma: repetir o abraço de São Francisco de Assis no Leproso de hoje — abraço amoroso e cheio de resignação, alegria e sobretudo compaixão.
01/11/2020
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